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Mariana Vasconcelos fundou em 2014 a Agrosmart
Mariana Vasconcelos fundou em 2014 a Agrosmart

Não é apenas na ficção, como ocorreu na novela Pantanal, que a bandeira da sustentabilidade chegou ao campo, especialmente com a defesa do sistema agroflorestal, que concilia a produção de alimentos com recuperação de áreas degradadas, a partir da plantação de florestas. Como consequência, promove a recuperação da fertilidade dos solos, estimula a volta das nascentes, diminui a erosão e garante a preservação da mata nativa.

Assim como na ficção, jovens cada vez mais capacitados querem levar ao campo ferramentas tecnológicas que garantam mais produtividade, menos impacto ambiental e mais rentabilidade aos negócios. A resistência, porém, existe e constitui uma das principais barreiras para o avanço das mudanças. Na prática, os novos agentes do campo, produtores rurais ou fornecedores de tecnologia e serviços, não buscam apenas o lucro, visam também o compartilhamento de benefícios sociais e ambientais.

“Representantes da segunda, da terceira geração [dos produtores], que começam a assumir os negócios têm na agenda ESG um dos pilares para o desenvolvimento do campo”, afirma Diogo Carvalho, diretor de internacionalização da SoluBio, empresa de biotecnologia que oferece solução completa para produção de bioinsumos na fazenda (On Farm). “Com eles, as práticas de ESG começam a sair do papel e passam a ser valorizadas. Em menos de uma década, as mudanças serão muito fortes.”

Pedro Miranda, 27 anos, criou, em agosto de 2020, a Abundance Brasil, ESG-Tech que financia novas florestas sustentáveis por meio de um ecossistema cooperativo de performance ESG. Segundo ele, cada Abudance Token - criptoativo sustentável lastreado em árvores - é vendido por R$ 100 e equivale a uma árvore. A startup comercializa o token e distribui crédito de carbono na modalidade restauração de áreas ao dono do ativo.

“A Abundance fica com 30% do valor do token, enquanto o dono da terra recebe 70%”, afirma. “Já temos uma floresta plantada de 100 mil árvores em Cana Verde, no sul de Minas Gerais, e comercializamos 9.420 árvores/tokens.” A meta, diz ele, é plantar 1 bilhão de árvores até 2030, o que exige entre 500 mil e 1 milhão de hectares disponíveis para esse fim. Até meados de 2023, quatro novas florestas, no sul de Minas, Roraima, Amazônia e próximo ao Rio Araguaia, entrarão no ecossistema da startup.

Quando em 2014 Mariana Vasconcelos, então com 23 anos, criou a Agrosmart com o objetivo de ajudar o homem do campo a tomar decisões com assertividade, o termo agtechs (ou agritech) era pouco conhecido. “Ao longo desses oito anos tivemos um grande avanço. Muitas lideranças jovens despontaram, provocando mudanças consideráveis no agronegócio, seja no uso da tecnologia, ou na redução do impacto ambiental”, afirma. “Até 2030, a geração Z somará 75% dos consumidores, jogando luz sobre a qualidade do alimento que colocamos na mesa, rastreando toda a cadeia produtiva, punindo as empresas com forte impacto ambiental e valorizando as marcas que adotam a agenda ESG.”

Hoje, a Agrosmart monitora, coleta e processa dados de plantações de mais de 30 tipos de cultivo espalhadas por 800 mil hectares de maneira remota ou presencial, por meio de sensores no solo, a fim de definir as melhores condições de plantio e ajudar produtores rurais a serem mais sustentáveis. Para isso, aplica a rastreabilidade para mensurar a pegada de carbono, o consumo de água e outros indicadores ligados à agricultura regenerativa. No início deste ano, colocou em operação uma plataforma corporativa ESG, com o objetivo de ajudar as empresas a acompanharem aspectos ambientais, sociais, de governança e de operação de toda a cadeia do agronegócio.

Segundo Vasconcelos, o avanço da agricultura sustentável e da agenda ESG ainda enfrenta barreiras. “A conectividade é um grande problema, assim como a inclusão digital e a falta de conscientização ambiental. É preciso repensar métodos para adotar as melhores práticas”, afirma. “Soma-se a isso a falta de incentivo financeiro, uma vez que o produtor latino-americano, em sua maioria, depende de crédito safra a safra.” Na visão de Vasconcelos, atravessamos um momento de transição da agricultura tradicional para o agro inteligente.

Para Maria Paula Castro, COO da EcoTrace Solutions, o apagão de mão de obra especializada no campo e a demanda cada vez maior do mercado por transparência, redução do impacto ambiental e avanço na agenda social têm provocado mudanças na cultura dos gestores e despertado o interesse dos jovens em se fixar no campo. “Cada vez mais o mercado demanda por empresas mais éticas e sustentáveis”, diz.

Fundada em 2018, a agritech tem como principal objetivo fazer a rastreabilidade de commodities, de maneira segura, confiável e auditável. “Atuamos em todos os elos da cadeia, do produtor ao consumidor final”, diz Castro. “Além da garantia de origem, ajudamos a tornar os processos 100% auditáveis com uso da tecnologia blockchain, o que torna o agronegócio mais transparente, confiável, padronizado e sustentável.”

Quem também viu no campo uma oportunidade foi Ronan Campos, que em 2016 abriu a IDGeo, agtech com foco no monitoramento de lavouras e usa a inteligência artificial para fazer diagnóstico remoto e otimizar a operação. “Eu acredito que a sustentabilidade e a rentabilidade das lavouras virão com a otimização da agricultura, ou seja, produzir mais no mesmo terreno, diminuindo a demanda por novas áreas”, afirma. “Nossas ferramentas ajudam na tomada de decisões mais precisas tanto para quem está no campo como para quem bate o martelo, que são duas pessoas bem diferentes.”

Campos afirma que a IDGeo é a única empresa a oferecer um produto escalável para localização de daninhas na lavoura usando radar, o que viabiliza o mapeamento de grandes áreas. “Os resultados são surpreendentes. Conseguimos reduzir em 23% a perda de produtividade de floresta, gerando uma economia de R$ 1,2 mil por hectare num ciclo de sete anos de produção de eucalipto”, diz. Segundo, ele, apenas por deixar de usar mais herbicida, o produtor economizou R$ 20 por hectare – economia essa que pode variar de R$ 20 a R$ 140 no caso da cultura de cana de açúcar –, o que numa área de 200 mil hectares, gera uma redução de custos de R$ 4 milhões, sem contar a redução do impacto ambiental.

Fonte:

Katia Simões 
Valor

 

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